quarta-feira, 20 de março de 2013

Ser fiel ou não ser fiel - Eis a questão


Um conto, sobre ser fiel aos amigos. Se você tem menos de 18 anos, não leia.



O início desta história deu-se na primeira metade dos anos 80. Mal saído da adolescência eu era considerado um jovem bonito, mas sem aquela beleza feminina, pelo contrário, rosto com traços fortes, olhos verdes, cabelos claros. Minhas amigas me diziam que ninguém seria capaz de resistir a um olhar e um sorriso meu. Bem, eram minhas amigas, portanto o quanto existe de verdade nisso é questionável. Fato era que não tinha dificuldade de ter vários relacionamentos vazios. Os anos 80 também ajudavam nisso.

Ainda estudante de Medicina, jogava tênis três noites por semanas. Tinha um parceiro de duplas com o qual fiz grande amizade por uns dois anos. Na quarta-feira depois do tênis íamos até a casa dele jogar xadrez. Ele era casado apesar de ter cerca de 22 anos, por aí, não me lembro deste detalhe. Uma quarta-feira ele não apareceu para jogar, mas antes de sair para o clube recebi um telefonema da esposa dele para passar na casa depois do tênis para a partida de xadrez.

Cheguei à casa dele mas este amigo não estava. A esposa disse que ele iria demorar um pouco, mas chegaria. Ela me serviu um Hi-fi, que eu sempre bebia nestas noites. (minha paixão por vodca é anterior à paixão pelo tênis feminino russo). Sentei-me numa ponta do sofá de 3 lugares e fiquei cabreiro quando ela sentou no meio do sofá e começou um papo bem direto do quanto ela me achava atraente. Nem terminei o drink (e bebo rápido, em 4 goles mais ou menos) e ela já estava com a mão aonde não devia e beijando-me a boca. Levantei-me rapidamente, não foi “no susto” porque estava esperando. Disse a ela que respeitava o meu amigo .... (Lembro-me do nome, é claro, mas não vou dizê-lo aqui, né?) ...etc e me mandei.

Não dormi direito aquela noite pensando se deveria contar ou não, nem a do dia seguinte, mas porque dava plantão no Hospital Geral do Estado, ainda no bairro do Canela, toda quinta-feira à noite. Com duas noites mal dormidas, na sexta-feira após a aula passei rapidamente em casa para me trocar e ir ao Clube Bahiano de Tênis, já decidido de que nada falaria a meu amigo.  Afinal omitir não é mentir. Quando precisamos, acreditamos nisso.

Quando o vi no clube, não precisei dizer nada, ele já apareceu bufando, me chamando de FDP e com a mão fechada. Eu sabia que ele lutava, mas eu praticava artes marciais e aproveitei minha maior envergadura já que eu era quase vinte centímetros mais alto do que ele. Antes que eu tivesse ao alcance dele, acertei um direto no queixo que o derrubou. Facilmente o imobilizei, esperei que ele parasse de me xingar para dizer, não me lembro bem as palavras exatas afinal já tem um quarto de século, mas deve ter sido mais ou menos assim: “Não fiz nada com ela. Você que me conhece (na verdade não conhecemos ninguém, aprendi com os anos) deveria saber que eu não te sacanearia. Não sou escroto, mas eu bem que devia ser, seu corno de merda”.  Percebi que já tinha gente suficiente em volta para soltá-lo. Esses conhecidos do tênis certamente o impediriam de tentar levar uma surra, pois este seria o desfecho óbvio. E assim foi.

No momento que o vi com a mão fechada na minha direção soube de imediato que a nossa amizade estava terminada. Mas estava com a minha consciência tranquila. Por uns bons anos evitei ficar a sós com mulheres de amigos, afinal gato escaldado tem medo de água fria.

Alguns anos depois, no início dos anos 90, vivendo no Rio, estava no Shopping Rio-Sul em Botafogo quando encontrei o filho de um grande amigo, no Shopping, quando este garoto de 17,18 anos me colocou a seguinte situação: Se eu estivesse interessado na namorada de um amigo, o que eu faria? Lembrei-me do caso acima e contei-o a este garoto, que com o passar dos anos tornou-se também um amigo.

Ele me perguntou: “Mas o que você faria hoje, sabendo disso”.

Perguntei de volta: “Essa namorada é muito atraente?”.

Ele: “Muito atraente mesmo”.

Respondi: “Sendo assim, se ela não der em cima de mim, fico no tesão mas não perco a amizade por isso. Mas se ela der em cima, já que eu vou perder o amigo mesmo, mato o tesão junto com a amizade”.

Ele não disse nada, achei que ele estava interessado na namorada de algum amigo. Anos depois soube que não era exatamente isso. Um grande amigo dele dera em cima da namorada dele.

Depois de alguns anos longe do Rio, no final dos anos 90 voltei ao Rio para fazer outra pós-graduação. Recém-separado da mãe de meus dois filhos, morava em um apartamento na Prado Júnior, próximo do “Cervantes” aonde eu sempre comia um sanduíche por volta das duas da madrugada, principalmente o de pernil com abacaxi.

Nesta época eu saía do Fundão por volta das três da tarde para dar tempo de chegar em casa e caminhar pelo calçadão de Copacabana antes do anoitecer. Nestas caminhadas encontrava frequentemente no calçadão de Copacabana a namorada do amigo do Shopping, que ainda era a mesma. Ela andava sempre com a irmã e geralmente as duas mudavam de direção para me acompanhar. Algumas vezes elas passavam no meu apartamento e conversávamos amenidades.

Numa das muitas madrugadas, em que eu trabalhava no computador, tocaram a campainha do meu apartamento por volta de 1 hora. Pelo olho mágico vi que era uma garota e tinha os cabelos parecidos com a namorada do amigo do Shopping. Como o olho mágico estava muito arranhado, não dava para ver direito as feições. Pensei o que ela estaria fazendo ali naquela hora da madrugada. Abri a porta e vi que não era ela, mas uma linda garota de programa que me perguntou se eu era um tal Sr. X (vê se vou me lembrar do nome de alguém que nunca vi na vida, dez anos depois?). Respondi que não, que era engano. Ela: “Que pena”. Eu olhei para a garota, era destas de catálogo (se bem que eu nunca andei vendo estes catálogos, apenas sei da existência deles) e disse: “Não seja por isso, pode ficar aqui, mas não vou pagar nada”.  Ela era linda, valia o convite. Para minha surpresa ela aceitou. Aos quase 40, estava no auge de minha forma física e segundo minhas amigas antigas mais bonito ainda. (Isto definitivamente confirma minha falta de modéstia, mas é verdade). Uma hora depois ela saiu apressada certamente pensando que desculpa iria dar pelo atraso. No dia seguinte o porteiro me olhou com uma cara divertida e disse: “Se deu bem!”. Compreendi que os porteiros deixavam as moças subirem e que na noite anterior o “cliente” deve ter interfonado várias vezes para saber o destino da garota.

Dias depois, quase no mesmo horário, tocaram de novo a buzina do meu apartamento. Vi uma moça de cabelos escuros compridos pelo olho mágico. Pensei que era a garota de programa ou uma colega dela querendo repetir o “engano”. Não era uma garota de programa, mas a namorada do amigo do Shopping. Mal abri a porta ela já foi entrando, linda, com um brilho sapeca nos olhos, bebaça, reclamando do namorado que não a satisfazia sexualmente. Passou os braços em volta do meu pescoço e com toda força me inclinou para que eu ficasse numa altura que ela pudesse me beijar. Então me beijou com fúria. Ainda atordoado, inicialmente correspondi, mas logo me desvencilhei. Perguntei como ela tinha chegado ali, ela respondeu que a irmã a deixou de carro e foi para casa. Como ela morava perto me propus a leva-la em casa. Ela foi direta: “Vim aqui para foder com você, se você não me foder vou dar pro primeiro que quiser. Mário (Claro que não é o nome dele) que se foda. Eu quero gozar. Cansei de servir de boneca inflável. Ele nunca me chupou, goza e vira de lado. Que se foda. Eu vou é gozar com você.”

Não sabia o quanto de álcool era responsável por ela estar dizendo isso, mas que tinha álcool não havia dúvida, ela nunca usara palavras “pesadas” comigo. Com um tom suave disse para ela: “Não sou o tipo de homem que transa com mulher alcoolizada, vamos tomar um banho, depois um chá e aí veremos”.

Dar o banho nela foi difícil. Ela tinha um corpo de carioca (preciso dizer mais?) e ficava me beijando o tempo inteiro. Me tocava e obviamente reagi. Ela olhava pro dito cujo enquanto o pegava e dizia: “É hoje”. E eu pensava: “Me fudi, perdi um amigo”.

Nem ensaboei, o banho foi água fria somente. Tirei ela do box, enxuguei-a e tentei colocar a calcinha dela enquanto ela resistia dizendo: “Para quê?”

Respondi: “Para não tomar o chá pelada”. Consegui finalmente que ela vestisse a calcinha. Procurei uma camiseta, mas não tinha nenhuma limpa a não ser a que eu vestia. Lavava minhas roupas a cada quinze dias numa lavanderia na mesma quadra, e isto seria dali a dois dias. Peguei uma camisa de “trabalho” branca limpa, que nela se transformou em vestido curto de botões.

Assim que preparei o chá, quando a olhei para servi-la ela estava encostada, girando a calcinha no dedo indicador da mão. Aquela visão icônica de uma mulher nua somente com sua camisa, ela parecendo a Jane Birkin. Minha mão que jamais tremeu nas cirurgias que fiz não conseguia segurar firmemente a xícara, o barulho das porcelanas se batendo, eu agradecendo de não ter enchido a xícara. Deixei em cima da mesa e sentei-me. Disse-lhe para tomar o chá de erva cidreira para evitar a dor de cabeça pela manhã. Depois que ela tomou o chá, levei-a até a cama, deitei-a no colo e pedi que ela me contasse o que aconteceu com Mário. Fiquei acariciando os cabelos dela, e quando eu falava o fazia num tom monocórdico até que ela adormeceu. Acomodei-a direito na cama e fui dormir no sofá-cama da sala.

De manhã a acordei porque tinha que chegar cedo ao Hospital do Fundão.

- O que aconteceu? Como vim parar aqui? – Perguntou ela.

- Segundo você. Sua irmã te deixou aqui. – respondi.

- E o que eu vim fazer aqui?

Não sabia se ela estava mentindo ou se estava mesmo com amnésia alcóolica, até hoje ela jura que não lembra.

- Você chegou dizendo que queria transar comigo.

- Nós transamos?

- Claro que não. Você estava bêbada. Te dei banho, te vesti e te coloquei para dormir. Dormi aqui no sofá.

Ela viu que o sofá estava com roupa de cama toda amassada.

- Obrigado, e desculpa pelo vexame (não foi o termo vexame, não me lembro do termo, apenas que ela se desculpou).

- Não foi nada. Você estava bêbada. Tem café solúvel. Vou te deixar em casa antes de ir para o Fundão.

Ela me olhou “daquele” jeito. E sorriu. Não precisava dizer mais nada. De imediato nós dois sabíamos o que iria acontecer.

O que aconteceu eu não conto. Não tem importância. A “moral da história”? Também não tem.

Faça o que fizer, você sai perdendo, uma amizade, uma consciência limpa, um pecado cometido, ou um pecado não cometido (porque existem pecados que valem a pena serem cometidos). No fim, ganha apenas uma coisa, uma história para contar.

6 comentários:

  1. Adorei ler isso. Me fez conhecer sua intimidade com integridade. Isso é para poucos homens, já que a maioria se aproveitaria da bebedeira da garota.
    Titus...já te imaginava irresistível. Superou minha imaginação... Ser fiel pode valer a pena. OU NÀO!

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  2. Professor Titus, rsrs.
    Sou ex-aluna sua e vou lhe dizer que eu e minhas amigas da turma achamos seu sorriso irresistível. Seus olhos são os mais lindos do mundo e vou discordar de você porque você não é bonito é lindo. A sua matéria foi a única que não tive nota alta porque é muito difícil prestar atenção no que você fala porque prestava atenção no Deus grego que você é. Conhecendo você entendo muito bem o que sentiu estas mulheres que você citou no conto. Você é pão pra mais de metro.
    Juliana (lembra de mim?)

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    1. Publiquei para ver se o zoador(a) se identifica. Se isso não for trote, tive muitas alunas Julianas, só no semestre passado foram 4. E sendo minha aluna, conhece meu estilo brincalhão, portanto segue a pergunta: Assistia minhas aulas com o auxílio de algum alucinógeno?

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  3. BOICOTE ao VOTO no BBB.
    Não Votar pra não dar dindin pra Globo.
    A última votação foi uma miséria,4 milhões de votos.

    Me desculpe Nanda não vale nada,mas de repente o Nasser virou Anjo? Esqueceram de tudo que este canalha fez.
    Só a perseguição doentia no Eliéser já me basta.

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  4. Conto maravilhoso, final perfeito.

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  5. Adorei este conto. sou sua fã no twitter e aqui. Bjos.

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